Dicas para Glenn

Por
LARRY ROHTER/Revista Época

Cada vez que o jornalista americano Glenn Greenwald se mete numa encrenca no Brasil, meu telefone começa a tocar, com chamadas e torpedos de repórteres brasileiros, sempre com a mesma pergunta. Como outro jornalista gringo intrometido, que também foi perseguido pelo governo, qual é minha postura diante do esforço de expulsar ou indiciar o Sr. Greenwald, a bola da vez?

Minha resposta? Em matéria de liberdade de imprensa, minha posição é sempre invariável. Independentemente da motivação ou da fonte das gravações, as reportagens do The Intercept Brasil sobre contatos duvidosos entre o então juiz Sergio Moro e promotores da Lava Jato são legítimas e importantes. Denunciar judicialmente Glenn é uma tentativa de driblar a proibição de expulsar um estrangeiro com cônjuge brasileiro, estabelecida no caso de Ronnie Biggs e reafirmada no meu. O objetivo claro, como na investida de devassar suas finanças, é calá-lo ou pressioná-lo a sair do país. Como tal, é um exercício de má-fé. E, além de ser moralmente repugnante, a ação do governo é uma estupidez política. Permitiu ao ex-presidente Lula assumir a pose de defensor da liberdade de imprensa numa coluna no jornal Washington Post. Logo ele, chefe de um governo que cogitou uma lei de mordaça da imprensa e certa vez declarou que “a gente não pode permitir que nove famílias continuem dominando a comunicação e inventando mentiras”.

Mas gostaria de apontar alguns dos quesitos em que minha situação é diferente da de Glenn Greenwald. Minha mulher não é deputada, nem está envolvida na política brasileira; o marido de Glenn, sim. Eu não era partidário de nenhuma tendência ideológica; Glenn, obviamente, sim. Minhas reportagens seguiam a orientação de meu jornal de sempre escrever “sem medo ou favorecimento”; as de Glenn são abertamente parciais, torcem para o time do marido.

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2 Comments

  1. Mokvwap

    A Vaza-Jato com certeza surtiu efeito no STF, mas seu potencial de reverberação com o público foi drasticamente debilitado por causa da relação indireta do Glenn com o PSOL, que é um braço do PT. Independente da intenção ou legitimidade da iniciativa (que particularmente eu não vejo exatamente como nobre ou com objetivo de fazer justiça), para todos os efeitos, era mais um dos infinitos recursos e manobras do PT pela libertação do Lula. Não ajudava muito que existia um apelo bem visível aos garantistas do STF e encarnados na figura do Gilmar Mendes, com a intenção de fazer aquilo que é visto como a culminação das falhas da justiça brasileira: a anulação do processo e suas provas e a soltura do preso.

    Lembro de na época do evento, ter acompanhado alguns podcasts de esquerda como o Anticast em que os participantes ficavam inconformados com essa “quebra das regras” do Moro não ter gerado revolta na população, inclusive gerando simpatia em parte dela… bom, é compreensível, considerando que inclusive a própria esquerda sempre se valeu muito do discurso de que a justiça brasileira tinha regras que favoreciam os políticos e os ricos, e desfavoreciam os pobres. Ainda mais nesse contexto em que “quebrar as regras” era basicamente os agentes da lei se unindo para pegar um corrupto. E nesse contexto, “quebrar as regras” seria algo até positivo.

  2. Satanás

    O jornalista gringo Glenn Greenwald já entrou para a História do Brasil. Só um jornalista de verdade para divulgar o material recebido de fonte anônima que escancarava o comportamento ilegal das vacas sagradas da lava jato, como eram tratados pela imprensa nacional a patota sob o comando de juiz de primeira instância, depois premiado com o cargo de ministro da justiça. Não é à toa que Greenwald já recebeu o Prêmio Pulitzer (pelas reportagens divulgadas no jornal The Guardian) e o Prêmio Esso de Reportagem (pela reprodução das reportagens sobre o programa de espionagem de órgão do governo americano no jornal O Globo).

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