"Ser deputado é tranquilo... Faço de conta que trabalho", diz Paulo Maluf

Ricardo Senra – @ricksenra

Em São Paulo

  • Márcio Neves/UOL

    "(Ser) deputado é tranquilo: trabalho terça, quarta e quinta metade do tempo"

    “(Ser) deputado é tranquilo: trabalho terça, quarta e quinta metade do tempo”

Depois de ser duas vezes candidato à Presidência, prefeito de São Paulo outras duas, governador do Estado paulista e quatro vezes deputado federal, Paulo Maluf (PP-SP), aos 84 anos, diz preferir o último posto.

“Vou cumprir este mandato de deputado federal em 2018, aos 87 anos. Se estiver com boa saúde, não preciso fazer campanha para deputado. É só que dizer que sou candidato que estou eleito. Executivo não tem mais”, diz. E completa: “(Ser) deputado é tranquilo: trabalho terça, quarta e quinta metade do tempo. Faço de conta que estou trabalhando.”

Criticado por ter faltado a 8 das 10 reuniões da comissão especial que discutiu o impeachment na Câmara (“não tinha obrigação”), o político explica, em entrevista à BBC Brasil, que sua defesa pelo afastamento de Dilma Rousseff é apenas política.

“Ela é correta e decente, mas voto pelo impeachment”, diz, acusando o presidente de seu partido, o senador Ciro Nogueira (PP-PI), de ter negociado apoio ao governo sem consultar os demais políticos de sua base. Para Maluf, a negociação de cargos foi “espúria, para não dizer pornográfica” e Nogueira se comportaria de maneira “monocrática”, como um “ditadorzinho do Piauí”.

O político diz ainda considerar “uma vergonha nacional” o fato de seu partido ser o recordista de citações na Lava Jato, com mais de 30 investigados. Ele também comenta os casos de corrupção em que esteve envolvido, como sua recente condenação à prisão pelo Tribunal Criminal de Paris, por lavagem de dinheiro – à qual recorre na Suprema Corte Francesa.

Leia os principais trechos da entrevista:

BBC Brasil – Depois de defender o governo, o senhor anunciou que vai votar pelo impeachment. Por quê?

Paulo Maluf – Tenho muito respeito pela pessoa física da presidenta Dilma. Por todas as informações que tenho, e tenho informações na área econômica e política, ela é uma mulher correta e honesta. Sob este aspecto, deve ser inocentada.

Entretanto, no processo de votação, o meu partido (PP) e seu presidente Ciro Nogueira negociaram de maneira espúria. Toda negociação de partido tem que ser feita ou pela bancada, ou pelo diretório. Não pelo presidente. O presidente negociou presidência da Caixa Econômica Federal, Ministério da Saúde, Ministério das Relações Institucionais.

Como ele decidiu monocraticamente, pode parecer perante a opinião pública que fui parte desta negociata. Só tem uma maneira de provar que não fui: votar pelo impeachment. Portanto ela é correta e decente, mas voto pelo impeachment.

BBC Brasil – Isso significa o prenúncio de um divórcio com o PP?

Maluf – Não. O partido não fechou a questão. Se eu votasse contra uma decisão do diretório nacional eu poderia até ser punido. Mas não. Para provar que não sou base da operação de compra e venda, tenho que votar pelo impeachment.

A negociação de cargos é espúria, para não dizer pornográfica. Não é o presidente do partido que vai lá e pega uns carguinhos para seus companheiros.

BBC Brasil – E qual deveria ter sido a postura do governo nesta articulação?

Maluf – O governo por meio de seu ministro de Relações Institucionais, Ricardo Berzoini, poderia ter procurado a executiva do partido e a bancada e ter uma discussão aberta sobre quais são os pecados ou não do governo e como ele gostaria que fôssemos parte do governo. Foram no mínimo subterrâneos. Fizeram o acordo no porão da igreja e não no altar.

BBC Brasil – Como fica o clima entre o senhor e o presidente do partido daqui para frente?

Maluf – Não fica nada. Ele que vá ao governo e diga: eu decidi e não consultei o Maluf. Ponto final. Não tem clima nenhum. Uma coisa é a sua amizade pessoal, que tenho com muita gente, inclusive do PT, inclusive com o próprio Lula, que almoçou na minha casa. Mas eu sou independente. Tenho meu eleitorado.

O presidente do partido avançou o sinal e não consultou ninguém. Esse é um ditadorzinho do Piauí e quer dar ordem? Ele é senador, não vota na Câmara!

BBC Brasil – Acha que o governo vai conseguir apoio suficiente no processo de impeachment?

Maluf – É muito difícil. Infelizmente, a oposição radicalizou. Recebi ontem (quarta-feira), sem exagero, cem mensagens me congratulando porque mudei de posição. Eu estou onde estava, não me influencio por mensagens que me mandam. Não preciso do fulano de Rondônia que me mandou um e-mail para conseguir votos. Mas, eu digo, tem muito deputado que se influencia. [Por isso,] Hoje, é mais problemático barrar o impeachment.BBC Brasil – O tiro então saiu pela culatra?

Maluf – Acho para Dilma o tiro foi pela culatra. Dos 49 (deputados), ela poderia ter 29 (votos contra o impeachment). Acho que hoje não tem 20.

BBC Brasil – Há pedidos de impeachment contra Dilma, contra o vice Michel Temer e contra o ministro Marco Aurélio Mello, do STF. A ferramenta estaria sendo banalizada?

Maluf – Vamos falar de coisa séria! Uma entidade que não existe pede impeachment de um ministro do Supremo e você leva a sério? O ministro Marco Aurélio é um dos mais brilhantes, corretos e corajosos ministros que o Brasil já teve.

Agora, Movimento Brasil Livre eu não sei quem representa. A mim, não representa! Na minha visão, o impeachment sobre Michel Temer não vai se concretizar porque o Eduardo Cunha, que é muito esperto, pediu aos partidos para indicarem os membros (da comissão especial que avaliará o caso). Enquanto os partidos não indicarem, ele está coberto para não abrir (a comissão).

BBC Brasil – Alega-se que o pedido contra Temer é pautado pelos mesmos argumentos que os encaminhados a Dilma. Como avalia?

Maluf – Veja, os argumentos contra a presidenta Dilma são fracos. Os argumentos também contra Temer são fracos, não existem. O ridículo tem que ter um limite. Acho o seguinte: Dilma é correta e não tem razão para o impeachment.

As pedaladas na minha visão não são crime. Como também para o Michel. Mas minha posição é política (no caso de Dilma). No mínimo, a minha história tem que ser respeitada. Não me consultaram, eu tomo a decisão que os meus eleitores vão achar melhor.

BBC Brasil – O senhor diz que Dilma é íntegra e que o pedido de impeachment é fraco. Seu endosso ao impeachment não seria uma retaliação na direção errada, já que suas críticas são endereçadas ao presidente do seu partido?

Maluf – Não. Ela acertou na administração, mas errou na condução do processo político. Ela tinha que discutir com o partido, e não com o presidente do partido.

BBC Brasil – Como vê um eventual governo Temer?

Maluf – Conheço o Michel Temer há mais de 30 anos. É íntegro, correto e competente. Acho que fará um bom governo.

BBC Brasil – Muito se fala sobre a integridade dos deputados que fazem parte da comissão que avalia o impeachment, uma vez que mais de 30 são réus em diferentes tipos de ação. Como vê os comentários?

Maluf – O que acho verdadeiramente é que o fato de ser alvo de uma ação é democrático. Ser alvo não quer dizer que estão condenados.

BBC Brasil – Então têm legitimidade?

Maluf – Lógico que têm legitimidade. Olha, processos, eu saí da prefeitura com 150. Até porque eu plantei eucalipto e reclamaram que eu estava chupando água da terra. Das 150 ações, ganhei 147. O Maluf foi processado porque tem democracia. Na Rússia você não é processado… Nem no Afeganistão.

BBC Brasil – Essas três ações que restam…?

Maluf – Vou ganhar também. Você sabe que aqui tem muitos recursos. Se você ganha o Ministério Público recorre. Ganha de novo, o MP recorre. Enquanto não ganhar em última instância, não ganhou.

BBC Brasil – O senhor fala da Justiça brasileira, mas também tem processos no exterior, como na Justiça francesa, onde foi condenado a três anos de prisão por lavagem de dinheiro entre 1996 e 2005. E nestes casos?

Maluf – Também recorri. Lá é um absurdo, o mais absurdo do mundo. Abri uma conta secreta, sabe como foi? Em nome de Sylvia Lutfalla Maluf. Bem secreta: mulher do Paulo Maluf. Mais secreta ainda: mora na (ele cita seu endereço no Jardim América, bairro nobre de São Paulo). Mais secreta ainda: na avenue George V, num banco menor da França que é o Crédit Agricole.

E mandei os recursos para lá via Banco Central. Não tem conta mais limpa! Mas o gerente lá, que é um idiota, disse “lavagem de dinheiro no Brasil”. Bom, então quem tem que me julgar é o tribunal brasileiro, não vocês! Eu vou ganhar, eu recorri. (Dizem que) Eu quase destruí o sistema cambial brasileiro porque mandei um milhão de euros. Um milhão, com M de merda. Que lavagem que eu fiz?

Maluf é dono da Eucatex, de outras grandes empresas, entendeu? Mandei esse dinheirinho lá sabe para quê? Minha mulher é um exemplo de mulher. Somos casados há 60 anos. E ela gosta de fazer comprinhas, é isso. Mandei aquilo para lá para ajudar a balança comercial francesa. E eles querem roubar meu dinheiro! Pode publicar isso.

BBC Brasil – Já que o senhor levantou essa bola: brinca-se que seu nome não apareceu na lista da Odebrecht…

Maluf – Nem Odebrecht, nem Camargo Correa, nem Andrade Gutierrez, nem mensalão, nem petrolão, nem Lava Jato e nem Panamá. Esta é a prova provada de que as outras agressões eram políticas, sem base nenhuma. Dá licença: ‘Frangogate’ (escândalo de suposta compra superfaturada de frangos para merenda escolar, do qual foi absolvido).

Minha mulher tinha no sítio quatro galinhas que vendeu para um frigorífico e o frigorífico vendeu não sei para quem. Aí dizem que Maluf está fornecendo material para merenda escolar da prefeitura. Sabe, quando se tem má-fé, tudo vale. Mas não tem problema: estou vivo. Me imploram para ser prefeito de novo. Se eu fosse nomeado, quem sabe aceitaria, porque 84 anos não são 48. Mas fazer uma campanha na minha idade, o pior que pode acontecer é ganhar a eleição. Quando é que vou me aposentar? Nunca!

BBC Brasil – Uma candidatura à prefeitura está na mira?

Maluf – De jeito nenhum. Vou cumprir este mandato de deputado federal em 2018, aos 87. Se estiver com boa saúde, não preciso fazer campanha para deputado. É só que dizer que sou candidato que estou eleito. Executivo não tem mais. Não aceito ser ministro, ser governador, ser prefeito… nada. (Ser) Deputado é tranquilo: trabalha terça, quarta e quinta metade do tempo… Faço de conta que estou trabalhando.

BBC Brasil – O senhor apoiou o prefeito de São Paulo Fernando Haddad (PT) à prefeitura e recentemente recomendou o governador Geraldo Alckmin (PSDB) como presidente em 2018. Qual é a diferença entre eles?

Maluf – Haddad tem uma grande qualidade neste mar de lama: ele é honesto. Não tem nada, posso te garantir. Então não tenho nenhum ressentimento de tê-lo apoiado. O Alckmin eu conheço desde que era secretário de Transportes, aos 40 anos, e ele tinha uns 20. Magrinho, vereador de Pindamonhangaba, que vinha despachar comigo. Acho que ele é uma das reservas morais deste país. Não querendo repetir a fala do ministro (do Supremo Luis Roberto) Barroso, mas, né? ‘Meu Deus, é isso que nos espera?’

Se o Eduardo Cunha fosse realmente amigo do Michel Temer, ele não ia aparecer naquela foto (tirada após o anúncio de rompimento do PMDB com o governo) e, portanto, subir o Michel (a uma possível Presidência). Quem propõe isso? O presidente da Câmara que é o segundo na sucessão? Aquilo não ficou bem. Tanto que o ministro do Supremo (Barroso) fez uma indiscrição que foi gravada. Você pode publicar: se Eduardo Cunha fosse realmente amigo do Michel, ele não compareceria naquela reunião, tanto que Renan Calheiros não foi.

BBC Brasil – Como avalia a operação Lava Jato e a atuação do juiz Sérgio Moro?

Maluf – Ele está imbuído de ser um justiceiro, o que para mim é uma qualidade em um juiz. São uns 20 juízes no gabinete dele. E um deles cometeu um deslize, tanto que ele reconheceu e se desculpou com o Supremo. Se eu fosse o juiz, fechava os autos das gravações de Lula e Dilma e mandava para o Supremo. Agora, tirar o segredo de justiça de uma gravação ilegal… Não acho que ele fez de maneira pensada, nunca nunca, mas ele ter pedido desculpas ao supremo já demonstra que ele sabe que errou.

BBC Brasil – Muita gente diz que a operação, apesar de sem precedentes no combate à corrupção no país, privilegiaria investigações contra o PT. Como vê os comentários?

Maluf – Não, eu acho que não. Quando você está nos holofotes, você tem 50 repórteres que querem conhecer a sua vida. Não encontraram nada dele, então até que me provem o contrário eu o acho correto.

BBC Brasil- O PP é recordista de citações na Lava Jato. Como vê?

Maluf – Isso é uma vergonha nacional. O (deputado) Jair Bolsonaro, que saiu do partido, infelizmente, porque é um homem correto, disse: na Lava Jato só não tem dois, eu e o Maluf, o resto foi tudo. Hahahaha. Eu não preciso de dinheiro para me eleger! Você anda nas marginais, Maluf que fez. Nos túneis, Maluf que fez. No metrô, Maluf que começou. Eu tenho serviços prestados. Construí 999 escolas no Estado.

 

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