Sapos, bagres, pererecas e outros bichos

Por Reinaldo Azevedo/F.S.Paulo

Não em razão do tamanho do seu partido, mas do número de votos que obteve nas duas últimas eleições e do espaço que ocupa na imprensa, Marina Silva, a líder da Rede, se tornou a principal força auxiliar da presidente Dilma Rousseff. Nem boniteza nem precisão, mas esperteza. Aquele jeitinho de quem só toma vitamina de chuchu com rúcula esconde um modo bem cruento de fazer política.

Dilma e o PT fizeram de Michel Temer o seu principal adversário. A máquina federal entrou na disputa pela liderança no PMDB na Câmara e busca dificultar ao máximo a recondução de Temer à presidência do partido. A mão armada da turma é Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado, investigado em seis inquéritos, mas nunca denunciado por Rodrigo Janot.

E Marina? Voltou à cena. Concedeu uma entrevista a esta Folha em que abusou do incompreensível a serviço do etéreo. Sua glossolalia política é capaz de produzir coisas como esta: “Impeachment não se fabrica; ele se explicita em função dos fatos que o justificam”. É mais ou menos como dizer que uma peça de mortadela se explicita em função das coisas que a justificam como peça de mortadela. Marina sempre se esforça pra me matar de tédio. Ainda bem que existe a vodca.

A líder da Rede não quer o impeachment porque prefere Dilma se esvaindo no cargo. Pouco se lhe dá se o Brasil terá dois anos consecutivos de recessão perto de 4%, depois de ter crescido 0,1% em 2014 e às vésperas de ter crescimento zero em 2017. Pouco importa a Marina que o país vá para o brejo, junto com os sapos, os bagres e as pererecas. Um PT em frangalhos e uma Dilma que mal consiga pôr o nariz fora da porta são essenciais para seu projeto pessoal em 2018. Só por isso ela não quer o impeachment e também decidiu que Temer é o inimigo.

No domingo, do nada, Marina e seu partido afirmaram que, caso o atual vice venha a ser presidente, há o risco de a Lava Jato ser paralisada. Por quê? Não há explicação. É puro terrorismo. Ela raramente se explica. Emite fatwas, com os seus xales descolados de tecido cru, seu coque severo e sua magreza que parece aspirar à santidade.

Não leu “Júlio César”, de Shakespeare. Deveria fazê-lo. O Número Um de Roma diz a Marco Antônio que mantenha Cássio, o magro, longe dele: é “seco por demais”, “pensa muito”. À sua volta, diz, só quer gordos de cabelos luzidios. Não faço juízo de valor a partir de aparências. Só estou, como se passou a dizer nestes tempos, “problematizando a narrativa” do falso ascetismo, bastante sedutora nesta era pós-leitura.

O que dizer a Marina Silva? Esperteza demais, especialmente quando vazada naquela Niágara de substantivos abstratos e sintaxe rocambolesca, acaba engolindo a dona. Como já engoliu.

Dados os crimes de responsabilidade cometidos por Dilma, e esses são óbvios (isso se chama “base jurídica”), e a incapacidade da presidente de tirar o país do buraco –ao contrário: ela o afunda ainda mais (e isso se chama “questão política”)–, a única coisa sensata a fazer é aderir ao impeachment. A menos que um valor mais alto do que o país se alevante.

Marina acha que a única coisa sensata que pode acontecer é ser ela a presidente do Brasil. Apela, como de hábito, a substantivos celestes, mas de olho em coisas bem mais terrenas. A turma que toma vitamina de clorofila se extasia e tem visões do paraíso.

Mesmo com o país no brejo dos sapos, dos bagres e das pererecas.

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Um comentário

  1. Devil

    Só um completo idiota pra dizer que Marina Silva “se tornou a principal força auxiliar da presidente Dilma Rousseff”.

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